sábado, 16 de janeiro de 2010

Heliotropia

Hoje eu não queria levantar
Não sei o que me fez sair da cama
Queria ter ficado deitado até anoitecer e depois dormir novamente
Queria ficar deitado e ver o sol se levantar e descer infinitas vezes
Queria sentar em minha varanda e ver o mundo se transformar em pó
E depois que todos morressem eu iria colocar as cadeiras sobre as mesas , desligar a luz , e trancar a porta
Depois eu sairia andando pelo mundo pisando nos restos das coisas que foram e que nunca mais seriam algo
Brincaria nelas como se fossem neve
Deixaria minha marca la para ser apagada pelo vento
Subiria em uma montanha
E assistiria o sol se apagar

quarta-feira, 13 de janeiro de 2010

Mente Adormecida

Eu sei que nesse momento minha mente esta dormindo. O meu pensamento disperso misturando todo o meu conhecimento em uma espiral que afunda cada vez mais, tornando o despertar cada vez mais difícil. Sei o que se deve fazer, tenho a consciência de que devo acordar, mas meu corpo foi dominado pelo desejo do descanso. Era como se os meus desejos surgissem e fossem satisfeitos instantaneamente. É um prazer pós gozo infindável. Dormir acordado: é a coisa mais estranha que já me ocorreu.
Eu tenho que acordar, mas quero permanecer assim. Contradições acentuadas pela falta de alguns elementos essenciais da vida humana que minha mente insiste em fantasiar e se engana achando que pode substituir a realidade por imaginação. É uma paixão insaciável e está a todo o momento se satisfazendo e querendo mais. Como se sua sede nunca acabasse e você continuasse a beber por achar que ela está sendo suprimida. Ilusões. Armadilhas da mente. Você quer aquilo que não pode e pensa estar alcançando.
E acho engraçado quando eu, sem querer, percebo que estou no meu trabalho e que pessoas a minha volta estão acordadas e fazendo seus deveres. Era como isso não fosse real. Da para sentir o doce tornar-se amargo na boca. Então eu volto ao meu mundo interior.
Tranqüilidade. Agradeço a deus por esse momento, mas sei que na frente eu vou me arrepender por não ter feito muita coisa agora. Tudo de mim foi sugado. Terei que construir algo do nada, e enquanto eu espero a chuva passar, fico sentado sentindo seus frios pingos caindo sobre mim como se fossem agulhas gélidas. Olho para cima para aquele céu formado por algodões de diferentes tonalidades de cinza e dou um sorriso desajeitado, por saber que logo a chuva passaria e que eu teria que me mover.
Passo minha visão pelas nuvens ate chegar a uma parte mais clara onde o sol está se abrindo, e a luz incrivelmente branca me ofusca. Quando novamente abro os olhos percebo que não era o sol, mas a lâmpada fluorescente do escritório que ofuscava minha visão. Vou acordando aos poucos sentindo aquela leve irritação que as manhas me causam. Estico-me na cadeira fofa e inflexível de rodinhas ate quase ficar deitado. Então me apoiando sobre seus braços de aço me ponho a sentar relaxado e curvado em frente ao quadrilátero brilhante a minha frente. O cabelo encostando-se a minha testa fazia cócegas, por isso franzi a testa levantando as sobrancelhas e de esguela pude perceber a lista de tarefas a fazer impressa em letra de forma exageradamente grande em um papel timbrado com a marca amarela da empresa. Os eflúvios de café do funcionário ao lado vinham a mim trazendo um estimulo a mais. Paro e penso: “hora de acordar”.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2010

Coração de Madeira

A noite cai sobre a tarde deixando aquela luz branca, quase azul, sobre minha janela. Tento levantar-me de minha cama empoeirada, porém macia, para acender a lâmpada. Exceto por mim meu quarto esta vazio, e estático. Tudo tão mórbido quanto uma arvore podre. O violão encostado na parede perto do guarda roupa é uma efígie com uma capa de chuva preta. O pó que flutua pelo ar faz o ambiente parecer uma sala de um navio naufragado em um oceano amarelo e velho, como se tudo fosse visto por fotos antigas. Observo tudo isso enquanto faço minha pequena, mas demorada, ida ao interruptor. E , quando finalmente consigo sentar, a lembrança da minha promessa vem à tona deixando aquela excitação correr pelo meu corpo.
Dando um suspiro ergo-me com a ajuda dos quatro membros. Pressionando a palma da mão contra a cama, percebo que minha sensibilidade nas pontas dos dedos foi levada pela dedicação ao trabalho. Contudo eu me sentia bem com isso, pois sabia que de uma forma ou de outra a recompensa viria. Então apertei mais forte ainda o colchão e os lençóis e levantei para encarar a noite que se aproximava. E só depois de estar em pé que eu percebi todas as minhas ferramentas espalhadas na cama. Todas elas, minhas preciosas e brilhantes facas, dos mais variados tamanhos e formatos e com o fio capaz de cortar ate mesmo aço, ou transpassar o osso externo de uma pessoa e dilacerar as veias de seu coração facilmente; pareciam sem importância, perante o resultado prévio que não brilhava, mas chamava de uma forma única a minha atenção. A sutileza nos detalhes das veias que pareciam vivas e a forma que pairava entre a representação e o órgão propriamente dito me tomaram alguns minutos antes de apertar o interruptor que estava a alguns metros a minha direita. Arrastei minha mão pela parede ate achar o botão e Pressionei-o, sentindo ele ranger e estalar.Precisava trocar aquelas molduras que talvez no passado ,poderiam ter pertencido a algum hotel de luxo. Mas achava interessante o modo que a moldura em forma de leão parecia me encarar e talvez ate me vigiar. Por isso mesmo ela quase caindo de velha eu permiti que ficasse ali.
Mal poderia acreditar que eu mesmo tive tamanha displicência com o que eu achava que era a minha maior paixão na vida. Outras vezes eu ficava sem jantar ou mesmo desfalecendo de sono deixava tudo impecavelmente e metodicamente em seu lugar. Agora, algo mais forte gritava dentro de mim, algo incontrolável e transformador, me movendo vagarosamente em uma direção diferente, assim como o vento move uma duna de lugar. Já não estava mais onde eu pertencia. Estava em outro lugar, e já não era mais o dono de mim mesmo.
Pensei em transferir tudo a algum local mais apropriado e já estava me inclinando e pegando a lamina mais delgada, quando uma fome ainda mais fina se abateu repentinamente em meu ventre. Quantas horas fazia desde a ultima refeição? Não sabia dizer. Talvez um dia, e justamente por não ter perdido essa noção e notar certo tremor nos meus joelhos, apenas recolhi tudo e pus na mesa ao lado da serra.
Andei em direção a cozinha sorrindo comigo mesmo por notar a paródica contradição na minha vida. Estava tudo tão desorganizado e perfeito ao mesmo tempo, que era como se aqueles lugares inapropriados fossem certos, ou como se você tivesse colocado o seu peixe dourado na sua banheira e estivesse feliz com isso. A verdade era que eu poderia rir de qualquer coisa desde que eu finalizasse meu intento.
Encostei-me a pia para lavar minhas mãos ainda sujas daquele liquido outrora tão cheio de vida, porém enrijecido e negro agora. O som da água cristalina caindo e a fricção das minhas mãos era tudo o que se podia ouvir naquele momento, e sem perceber meus pensamentos novamente pairavam sobre imagem dela. Ela de vestido branco e um sorriso tão lindo quanto sua aura que se estendida e me envolvia sem eu perceber.Ela era magnífica e incrivelmente distinta. Dizem que a alma veste o corpo, mas nesse caso é o contrario, pois ao tocar a sua pele as sensações que eu tenho transcendem todo esse mundo físico.
Mas meus pensamentos são interrompidos pelo bater das asas de Mefisto que chega e se dependura no galho de minha macieira que fica quase rente ao umbral da porta que da para o quintal. Tinha a ponta do bico prateado, talvez de tanto roubar bijuterias, e uma estatura menor que as suas semelhantes. Sempre vinha me visitar a essa hora e mesmo depois que eu a alimentava com algumas sobras e migalhas ela ainda assim permanecia. Ficava me observando ate que eu começava mexer em minhas ferramentas, então a ave ficava estática. E depois de certo tempo, como quem se acorda de um devaneio, ia embora subitamente. Nunca entendi o porquê disso.
Esse dia não foi diferente. Depois de cortar a carne separei um pequeno pedaço de aproximadamente uma polegada e joguei para o pássaro, que agilmente o capturou. Enquanto comia o pão e o assado, observava a criatura em sua avidez, beliscando e arrancando nacos minúsculos que deixavam se prender por membranas semitransparentes e me lembrava dos mendigos do mercado de Santa Luiza brigando por frutas semi-estragadas. Mercado pobre e lúgubre, porem palco de minha inusitada descoberta.




Depois de me satisfazer com todo o sal da carne meu paladar ansiava pelo oposto. Logo, levantei e puxando a cadeira fui em direção ao armário. No topo dele estaria uma cesta de frutas, que eu pensava ter deixado a salvo das pragas, mas logo eu descobriria que não. O armário por ser alto exigia que eu esticasse todo o meu braço por isso apenas pude tatear as bordas e avançar ao interior do recipiente em busca de algo comestível. Passando meus dedos sentia todo aquele pó acumulado da palha entrelaçada que logo tocaram em algo que não deveria estar ali. Parei um momento para adivinhar o que coisa felpuda era aquela quando aquilo subitamente agarrou-se em minha mão. Com um reflexo rápido, arquejei meu braço em direção oposta ao meu corpo, fazendo com que a cesta e o que a criatura sinistra caísse e logo apos pude escutar o som abafado delas caindo no chão. E com o coração pulsando rápido mais de susto do que de raiva, percebi com repugnância a hedionda ratazana que fugia rapidamente pela porta a fora.



Desci da cadeira ainda incomodado com o infausto acidente, mas fui consolado ao ver que nem todas as frutas estavam consumidas ou semi estragadas. Sobrara uma linda laranja, perfeitamente redonda em um degrade de amarelo para vermelho. E segurei a em mãos e instantaneamente senti seu aroma doce,que não foi extraviado pela podridão que se encontrava em volta, e uma tontura me invadiu e senti que a qualquer momento poderia desmaiar. Mas era apenas a ansiedade que disparava em meu peito e que levara oxigênio de mais ao meu cérebro juntamente com lembranças da primeira vez que eu encontrei com a pessoa em que algumas horas iria presentear.

domingo, 6 de dezembro de 2009

Alfinete


O alfinete fura carne
Profana alcança cerne
Para dor infinita agonia
morto agora ele não iria

Para o inferno silencioso
Inerentemente torturado
Agora ele volta malicioso
Corrompido pelo fardo

Correndo ele vai matando
Os da própria raça incendeia
Fogo profano corrompendo

Ate o mais puro que não cedia
A ausência buraco feito
Mãe de todas as feridas,vadia